Um Breve Resumo da História da Psiquiatria
Casos de perturbações mentais estão registrados por toda a
História e são, desde as épocas mais remotas, citados por
historiadores, poetas, pintores, escultores e médicos.
Apenas para citar algumas figuras históricas conhecidas, temos
os exemplos dos Imperadores Romanos Calígula e Nero, os reis
franceses Clóvis II e Carlos VI, este último chamado de Carlos,
o Louco, o qual acreditava ser feito de vidro e que inseria
pequenas hastes de ferro em suas roupas a fim de prevenir que se
partisse em pedaços. Eduard Einstein, filho do renomado físico
Albert Einstein, o lendário bailarino ucraniano Vaslav Nijinsky,
e o prêmio Nobel de Economia John Forbes Nash Jr, sofriam de
Esquizofrenia.
O famoso pintor holandês Vincent Van Gogh (1853-1890), durante
seu breve período de vida, sofria de crises de instabilidade de
seu humor. Diversos historiadores afirmam que Van Gogh sofria
"ataques epilépticos" o que para alguns seria o resultado do uso
frequente de bebidas contendo absinto (Artemisia absinthium),
substância que era utilizada para modificar a atividade cerebral
e assim "estimular" atividades artísticas. Houve diversas
tentativas de estabelecer um diagnóstico de certeza para a
doença de Vincent Van Gogh, o que tentou-se fazer através da
análise de seus escritos. Atualmente, o mais aceito dos
prováveis diagnósticos atribuídos a Vincent Van Gogh é o
Transtorno do Humor Bipolar, levando-se em consideração os
estados depressivos por que passava, alternados de episódios
eufóricos (ou maníacos) que lhe faziam mergulhar em um estado de
humor de grande energia e paixão. Van Gogh cometeu suicídio aos
37 anos de idade.
Há registros de que em civilizações muito antigas, como
Babilônia e Egito, havia indivíduos, muitos deles sacerdotes, os
quais descreveram alguns transtornos mentais, mesclando
explicações místico-religiosoas em suas descrições. Os egípcios
pelo seu conhecimento em anatomia humana, adquirido pelo hábito
de embalsamar cadáveres, produziram escritos destacando o papel
do cérebro e do útero na origem de transtornos mentais, sendo o
termo histeria (de hysteros, útero) utilizado até mesmo em
nossos dias. Na Grécia, algumas doenças mentais eram vistas como
sendo vinganças dos deuses, porém com o materialismo grego,
passou a atentar mais detalhada e profundamente para aspectos
naturais como sendo causadores de doenças mentais, e nessa época
foram inaugurados tratamentos médicos para alguns transtornos,
dos quais não participava a mitologia grega. Empédocles (séc V
A.C.) foi um desses precursores. Hipócrates (460-377 A.C), por
muitos chamado de o pai da medicina, foi o primeiro a afirmar
que a Epilepsia era uma doença cerebral, e, sabiamente, dizia
que a cura das doenças se dá com a participação principal da
própria natureza, sendo os médicos apenas auxiliares para os
processos de cura. Para ele o cérebro era o órgão central e
principal do corpo humano, de onde provinham os pensamentos e as
emoções.
Os seguidores de Hipócrates parecem ter sido os primeiros a
produzir uma classificação das doenças mentais. Porém, durante o
período medieval consta, segundo alguns autores, que prevaleciam
as explicações místico-religiosas para a origem de transtornos
mentais. E a Inquisição da Igreja Católica Romana torturava e
queimava doentes mentais em fogueiras sob a alegação de que
necessitavam de ser destruídos, pois estariam possessos por
demônios. E as supostas possessões teriam se iniciado por algum
envolvimento deliberado desses doentes com o Diabo.
O primeiro grande passo para o progresso científico da
Psiquiatria ocorreu apenas no século XVIII, com os estudos do
médico francês Philippe Pinel, o qual instituiu reformas
humanitárias para o cuidado com os doentes mentais.
No século XIX, Dorothea Dix lutou por melhoras nas condições dos
locais que abrigavam doentes mentais.
O médico alemão Emil Kraepelin foi o primeiro a subdividir as
Psicoses em dois grupos: A Psicose Maníaco-Depressiva e a
Esquizofrenia.
No caminho do grande desenvolvimento científico do século XIX, a
medicina se firmou como uma ciência. A psiquiatria veio a se
firmar como ciência médica algumas décadas mais tarde. A
psiquiatria acompanhou, em ritmo mais lento do que outras
especialidades, o desenvolvimento da Medicina como ciência.
Porém, devido ao complexo objeto da Psiquiatria, a mente humana,
houve uma mescla temporária científico-filosófica da Psiquiatria
com a Psicologia, esta última surgida da filosofia em meados do
século XIX.
Porém, devido ao papel do médico morávio Sigmund Freud, a
Psicologia foi procurando nas décadas seguintes a instituição de
um modelo próprio, o qual, em nossos dias, encontra-se
nitidamente isolado da Medicina Psiquiátrica, estando a
Psicologia definitivamente entendida como fazendo parte das
ciências humanas, diferentemente da Medicina, a qual pertence às
ciências naturais. Contudo grande parte dos psicólogos e mesmo
alguns psiquiatras hesitam e evitam apontar a natureza
filosófica da psicanálise, mesmo tendo sido um médico, Freud,
seu fundador.
Sigmund Freud enfatizava uma visão interpretativo-explicativa
para desordens do comportamento, frequentemente apontando para
algum acontecimento da infância do indivíduo.
Em 1910 foi formada a Associação Internacional Psicanalítica
tendo Jung como seu presidente. Porém a harmonia do movimento
durou pouco tempo. Entre 1911 e 1913 Jung e Adler formaram suas
próprias escolas psicanalíticas em protesto contra a ênfase de
Freud sobre a sexualidade infantil e o Complexo de Édipo, embora
toda a estrutura básica fundamental da psicanálise permanece,
até hoje, sendo freudiana.
Devido às influências de Freud e Jung, a maioria dos psicólogos
passou a reconhecer a existência de diversas escolas
psicanalíticas, o que acabou por se transformar em um enorme
grupo de correntes em psicologia psicanalítica, onde, hoje,
muitos livros e cursos de psicologia ou defendem de modo radical
alguma dessas correntes ou se limitam a apresentar todos os
tipos de teorias até hoje construídas, numa seqüência linear sem
nenhuma coerência aparente. Tais acontecimentos vieram a
influenciar notavelmente a Psiquiatria, isto, porém, até o
advento dos psicofármacos.
Interessantemente, foi um psicanalista Wilhelm Stekel, quem
declarou a inexistência do inconsciente, e as teorias
interpretativo-explicativas de Freud são consideradas
ultrapassadas por muitos médicos psiquiatras de nossos dias.
Este fato se dá, em enorme medida, pelos modernos conhecimentos
neuroquímicos do cérebro e pela revolução no tratamento das
patologias mentais após o surgimento, em meados do século XX, de
medicamentos psicotrópicos de eficácia incontestável. Cai, assim
por terra, a poderosa corrente psicanalítica radical dos
seguidores de Freud e Jung, a qual experimentou grande
popularidade na década de setenta, tendo influenciado a
sociedade em praticamente todo o mundo. E esta influência se
deu, sobretudo pela televisão e pelo cinema, onde se pode citar
o cineasta Woody Allen que fazia apologia da psicanálise.
Irônica e curiosamente, o próprio Woody Allen declarou, em 2002,
que suas produções contêm muito de ficção e pouco de realidade,
e que quase nada de suas sessões de psicanálise que mostrou nas
telas têm a ver com sua própria pessoa. Afirmou ainda,
categoricamente, que seus “grilos” mentais não têm origem em
traumas da infância:
“Minha mãe sempre disse que nos primeiros quatro anos de vida
fui uma criança adorável. Aí mudei. Mas não existiram
circunstâncias dramáticas nesse período. É um mistério. Atribuo
essa mudança a uma imprevista tomada de consciência sobre a
morte, algo de que nunca me recuperei”, disse. (Jornal Estado de
São Paulo/08/11/02).
Paralelamente à ascendência, apogeu e declínio da Psicanálise, a
Psiquiatria continuou a seguir seu rumo no sentido de seu firme
e irreversível lugar entre as especialidades médicas, seguindo o
modelo das ciências naturais. Hoje a Psiquiatria já habita seu
próprio território no mundo da Medicina: a Ciência Psiquiátrica.
Veja também: Famosos com Doeças Mentais
Dr Eduardo Adnet
Médico Psiquiatra e Nutrólogo